terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Presente de Natal...

... e de aniversário da minha Mãe. Para completar a minha sala. Foi arrematada hoje por menos 65 euros do que o preço original! Valeu a pena esperar. Devem entregar antes do Natal, depois conto-vos se fica bem. Tenho quase a certeza de que vai ficar!




Obrigado Mamã!

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

As mulheres árabes é que a sabem toda…

Aqui hoje estão cinco graus baixo de zero. Dizem que quando a temperatura baixa de zero não se sente a diferença mas é tanga. Os senhores informados da meteorologia explicaram que estes cinco graus negativos se sentiram como 19 graus negativos. Tudo por causa do malandro do frio.
Neste estado de congelamento geral, eu descobri coisas que nunca pensaria. Sobre mim próprio. Dei por mim a pensar que no mais fundo do meu ser gostaria de ser uma mulher árabe. É verdade, amigos. E agora vocês perguntam: Mas por que é que tu gostavas de ser uma mulher árabe? Eu respondo: porque uma mulher árabe tem uma coisa que eu não tenho. Bem… quer dizer… na realidade tem muitas, mas agora assim de repente só me interessa uma delas. Bem sei que as mulheres árabes, se ficarem lá pelas arábias, não estão sujeitas ao frio. Mas a verdade é que elas é que sabem como lidar com esta invernia. Eu tenho luvas, um casaco de penas, botas de borracha, meias de lã, dois edredões e um gorro. Mas as mulheres árabes têm mais do que isso… Elas têm uma burca! De cada vez que saio à rua, a minha maior ambição é ter uma burca. Já não quero saber de fatos, nem casacos, nem camisas com botões de punho. A peça de roupa que eu realmente quero é uma burca. Daquelas que tapam a cara toda, nem o nariz fica de fora. As mulheres árabes é que a sabem toda…




segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Alô Lisboa, aqui congelador

Bom dia meus amigos. Aqui está um grau abaixo de zero e prevêem 6 graus negativos – NEGATIVOS – para quinta. De máxima. A mínima será oito negativos. Não sei se entenderam, por isso repito: hoje, um grau negativo; quinta, seis graus negativos. É fresquinho, não é? Ontem andei na rua durante alguns minutos e julguei que os meus dedos iam congelar, nem com luvas, gorro, cachecol e a parka de penas se consegue pôr cobro ao rigor deste inverno. Que, em boa verdade, ainda não começou, se não me engano começa pouco antes do Natal. Isto ainda é só o Outono…
A boa notícia é que pude voltar à minha casa na sexta passada. Graças a Deus, a caldeira voltou ao trabalho após duas semanas de baixa por doença e múltiplas intervenções cirúrgicas. Outra boa notícia é que a minha chafarica mudou de instalações e estamos agora num edifício todo modernaço, onde finalmente podemos regular o ar condicionado. Mesmo com temperaturas negativas, trabalhávamos sob intenso calor tropical, fizesse verão ou inverno, qual microclima das Caraíbas. Aqui temos um magnífico interruptor que tem a distinta e apreciada função de comandar o ar condicionado. Nem que fosse só por isso a mudança já teria valido a pena.
Beijinhos e boa semana.



sexta-feira, 29 de outubro de 2010

A primeira vez

Vivas, aplausos e urras! Não estou ainda em mim. Deixem-me sentar um bocadinho a ver se consigo digerir isto…
Pela primeira vez em dois anos e meio, perguntei uma coisa e a minha chefe soube responder. De imediato. Não foi preciso explicar que eu estava a falar daquele assunto chamado alhos que não tem nada a ver com bugalhos. Não foi preciso repetir três vezes de forma diferente. E saí desta pequena converseta com uma resposta. Pode lá ser? Esta é que me apanhou de surpresa. Não estou habituado. Sinto-me tão perplexo que vou ao fisioterapeuta ver se recupero a normalidade…


terça-feira, 19 de outubro de 2010

A austeridade quando nasce… é para alguns

Este facto de estar a 2 000 quilómetros de distância permite ter alguma distância em relação às coisas. Permite colocar as coisas em perspectiva, que é algo que os meus colegas dizem que eu faço muito bem. E este histerismo sobre o orçamento para 2011 dá-me muito que pensar. A vocês também?
Tenho acompanhado na imprensa online (abençoada Internet) os planos de austeridade do nosso primeiro, os cortes orçamentais e as reacções da oposição. Como sabem, adoro ler sobre estes temas económicos. Mas está-me outra vez a cheirar a esturro. Não sei por quê, parece que estou a ver novamente o filme da Grécia, mas desta feita os protagonista são diferentes. As vítimas, essas, são quase sempre as mesmas. Uma colega falava-me hoje de um livro que explica como, em situações de crise, os governos aproveitam para efectuar mudanças drásticas que noutra situação não poderiam efectuar. Amplificam a crise até não poderem mais, dão a situação como caótica e quase irremediável para depois darem remédios que vão dar cabo do paciente. Assustam-no com a chegada do FMI e a ingovernabilidade. É uma espécie de lavagem ao cérebro em grande escala. O livro chama-lhe “estado de choque”. O paciente, que somos todos nós, já está tão mentalizado de que não há saída que aceita tudo o que lhe querem fazer. Mais ou menos como Portugal.
Ora reflictam lá comigo. Já pensaram que, no meio de tanto corte orçamental, há gastos que não levam com a tesoura? 53 milhões de euros para consultoria são essenciais, diz o governo. Então a ordem não é para poupar? O TGV é para manter. Mas não faltava dinheiro? Não estou a entender nada. Para pagar um portal qualquer sobre o centenário da República esturraram-se quase 100 mil euros (fui verificar no sítio dos contratos públicos). Mais uma vez, para isto houve dinheiro. Na Hungria, que também quer equilibrar as finanças públicas, o número de deputados foi reduzido de 386 para 200. Em Portugal não. O subsídio para campanhas eleitorais em 2009 foi de nove milhões de euros (até dá vontade de escrever por extenso). Ainda não ouvi nenhum político propor reduções. Há assuntos que simplesmente nem entram na discussão.
Vocês que estão aí mais perto talvez achem que a oposição está a fazer barulho, mas eu cá acho que não está a fazer nada. O Passos Coelho faz-se de difícil mas está bom de ver que fará a vontade ao governo. Não acham um pouco estranho? Já repararam que, de todo este imbróglio orçamental e de todos os sacrifícios que se querem impor aos portugueses, há uma classe que sai a ganhar? Os políticos nunca são beliscados e saem da crise mais fortes do que antes. Sejam do governo, sejam da oposição. A sua legitimidade sai reforçada, porque em tempos de penúria endireitaram o país. Daqui a uns anos, talvez por alturas de eleições, serão os heróis que nos salvaram do buraco. Já não estão comprometidos pelos licenciamentos duvidosos nem têm oposição interna. Uma das vantagens da crise é que se fala tanto dela que ofusca qualquer outro assunto. Deixa o paciente em estado de choque, lá diz o outro. E enquanto ele está em estado de choque, fazem dele o que querem…
Pensem nisso…
PS – Não me esqueci de contar a visita às plantas, ficou prometida e chegará em breve…

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

As luzes das colinas

Adoro chegar a casa e ver as luzes nas janelas dos vizinhos. Quando entro e me abeiro da varanda, o meu condomínio parece uma espécie de presépio iluminado. Uma luz aqui, duas ali, outras tantas acolá. Vem-me à memória uma canção antiga sobre Lisboa:

Lisboa adormeceu, já se acenderam
Mil velas nos altares das colinas
Guitarras pouco a pouco emudeceram
Cerraram-se as janelas pequeninas

Julgo que é uma canção dos anos 60, que agora ouço em versão renovada num disco absolutamente fabuloso que comprei quando estive em Lisboa. Canta a Anabela. Com uma voz muito doce e suave, sobre uns arranjos intimistas e sussurrantes. Assim a puxar para o jazz mas também há ali um som latino que me agrada. Só músicas do antigamente, mas com nova roupagem.
Claro que quatro prédios no meio de várias torres de escritórios não têm nada a ver com as colinas da nossa Lisboa. Mas há alguma coisa nas luzes das janelas que me reconforta.
Isto de se viver numa espécie de condomínio só tem uma pequena desvantagem: as pessoas – pelo menos algumas – adoram dar conta da vida alheia. Há umas semanas, organizaram um simpático jantar no jardim para que os vizinhos se conhecessem. Qual não é o meu espanto quando um deles começa a contar quem saía à varanda primeiro, quem tomava o pequeno-almoço fora e quem raramente ia ao jardim. Ora esta! Dei-lhe um desconto porque era uma daquelas bichas bruxelenses (quase tão típicas como os mexilhões) que não têm mais com que se entreter e têm uma coscuvilheira dentro de si. Mas eis que outra vizinha se vem juntar a esta exposição pública. Também ela dava conta dos horários e hábitos alheios.
Mas será que vocês não têm vida própria? Não têm trabalho, nem interesses? Não têm televisão? Nem o jantar para fazer? Porque eu tenho. Cambada…

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Há dias assim - 3

Hora de almoço. Salteado de marisco. Está óptimo, um dia destes ensino a fazer.




Apetece-me uma batatinha frita. Só uma não vai estragar a dieta. Bom, duas ou três também não... Deito as batatas fritas no prato e levo para a varanda. Mas sou interrompido pelo telemóvel. Entretanto, ouço qualquer coisa a voar. São as batatas, que já estão espalhadas pelo chão da varanda. Desligo. Apanho as batatas. Recomeço a refeição. Ainda não acabei, mas estava-me mesmo a apetecer uma empada. E até calha bem que tenho ali umas congeladas. Porreiro. Vou buscar a empada. Descubro que a arca tem meio metro de gelo na primeira prateleira. Agarro numa espátula – de entre as coisas que me ocorreram para tirar o gelo, foi a que estava mais à mão. Não, não procurei muito, escusam de perguntar. Começo a bater no gelo. Que começa a cair. Para dentro da gaveta. Tiro a gaveta. Ponho um prato de sopa para apanhar o gelo – não, também não tinha mais nada à mão e se tinha não procurei. Despejo o gelo, volto a colocar a gaveta, fecho a arca. Retomo a minha refeição e pelo caminho esqueci-me de que me apetecia a empada que está na origem desta cena. Levo de novo o tabuleiro para a varanda. A faca cheia de molho ganha vida e salta para o chão. Mas eu mantenho a calma, nada de irritações, “laisse tomber”. Termino a refeição e vou pegar no jornal que ficou na varanda. Então é que estão os horários dos cinemas? Página 32? Mas não há cá nenhuma página 32. O caderno principal só tem quatro páginas! Não pode ser, eu comecei a lê-lo no ginásio e tinha muitas páginas. Então a reportagem sobre a América dos confins na página 16? Não está cá. Faltam-me dois terços do jornal. Ora esperem lá… Eu comprei um jornal inteiro, cheguei a casa com um jornal inteiro e agora tenho um terço do jornal. Não estou maluco – acho eu… E não bebi nada, ok? Querem lá ver que o barulho de coisas a voar era o jornal? Inspecciono as varandas alheias em busca das secções perdidas. Nem rasto. Acreditam que perdi um jornal dentro da minha própria casa?

sábado, 14 de agosto de 2010

Olha que coisa mais linda...

A Grand Place de Bruxelas vestiu-se de flores. As begónias - são só begónias - são colocadas de dois em dois anos, com um tema diferente. Este ano foi a presidência belga da União Europeia. Subi à varanda da Câmara Municipal e fiquei sem palavras. Oram vejam:









quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Há dias assim - 2

Eu julgava que já me tinha acontecido tudo o que tinha a acontecer na tarde de ontem. Mas enganei-me. De onde veio tanto disparate havia mais.
Venho para casa, banho, mais Bon Jovi – alto e bom som - e jantar. (Ainda o assado, que entretanto foi hibernar para o congelador). Eis senão quando a minha tia me diz que ninguém atende do meu telemóvel. Não? Pois como é que hei-de atender se não toca? A propósito, que é feito dele? Vou ligar para mim. Ah, não o ouço. Não o tenho. Perdi-o. A histeria instala-se. Procuro, não acho. Desespero. Calma, deve ter ficado no ginásio. Que se torna no primeiro ponto de passagem do dia seguinte. Mas não está lá. Ligo a meio do dia, porque me lembrei de que ficou lá. Mas não está. Histeria absoluta, vontade de bater nalguém, tentativa falhada de destruir uma parede. Telemóvel novo não estava nas minhas contas. Além de que contém todos os meus contactos de Bruxelas. Procuro um novo telemóvel, cancelo o velho. Interrompo a histeria para ir regar as plantas da Vanessa. Mais uma chamada para o ginásio. Nada feito. Estou à beira de enviar uma mensagem aos amigos para que me enviem os seus contactos – já mesmo a carregar no botão “Enviar” - quando me ligam do ginásio com música para os meus ouvidos. Uma alma caridosa guardou-o no seu cacifo para não ser roubado. Há gente boa neste mundo. Nossa Senhora de Antuérpia ouviu as minhas preces. Amo esta desconhecida que me guardou tão valiosa maquineta. Não sei quem é mas amo-a assim mesmo.
Claro que no caminho para recuperar o bicho, entro numa camioneta suburbana, que já apanhei duzentas e vinte vezes, e o motorista decide que o meu passe não serve. Serve há pelo menos meio ano. Mas não hoje. Hoje tenho de pagar bilhete. Dois euros. Paga e cala, se não vai a pé. “Laisse tomber”, o telemóvel está a salvo…

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Há dias assim

Veio-me hoje à memória a canção que Portugal levou à Eurovisão este ano. Tinha por título «Há Dias Assim», que me parece uma forma muito apropriada de descrever o meu fim de tarde.
Desde que voltei de férias corro 25 minutos por dia no ginásio quatro vezes por semana. Dez deles na velocidade 8.2 e os restantes cinco na 8.5. Gasto pelo menos 220 calorias. Que, parecendo que não, são dois iogurtes de pedaços.
Imbuído deste espírito, subi para a passadeira. Mas não havia maneira de encontrar a música que queria no leitor de MP3. Passa um minuto, passam dois, e não saio da velocidade 5.2. Só mais um bocadinho… aos três minutos e meio, lá consegui encontrar os Bom Jovi. Ok, vamos lá passar para os 8.2. Dois minutos depois, algo toca perto de mim. Esta canção tem um telemóvel a tocar no meio. Que coisa mais parva. Mudo a canção. Esquisito, o telemóvel continua a tocar. E é o mesmo toque. Querem lá ver que é o meu? E era. Estava a tocar porque a minha Mãe me tinha deixado uma mensagem e, quando assim, é, o bicho toca sem descanso até que liguemos o número das mensagens e as ouçamos. Mais devagar outra vez, ó senhora dona passadeira. Agora voltemos ao normal. Aos oito minutos, quando pensava que era desta que ia manter a velocidade, vejo um atacador a desapertar-se. Mais um bocadinho e já te aperto. Mas entretanto já estão os dois desapertados. Carrego no botão. Pára tudo. Aperto os atacadores. Volto a ligar. Volto a correr. Quando finalmente abandonei a passadeira e me encaminhei para o balneário, pensando que já teria tido a minha quota mais a do vizinho, vejo uma quantidade de senhores à entrada dos duches como quem está na paragem de autocarro. «É a fila!», diz-me o último. Pronto, desisto, não faço mais ginástica, não tomo mais banho, não quero saber. Deixem-me ir para casa sossegado, sim? Não. Estava a vestir as calças quando um empregado decide começar a reparar os mosaicos quase debaixo dos meus pés. Então não haveria melhor altura para este serviço? Há dias assim…

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Para vos fazer inveja...

Eis o meu jantar de ontem (e hoje, e amanhã...) confeccionado por... mim!





Assado de atum com camarão. Só para vos fazer inveja e abrir o apetite - quer o leiam agora, que já é hora da ceia, ou amanhã quando estiverem esgalgados pelo pequeno almoço.
Fiquei muito satisfeito comigo mesmo, pois não só o assado saiu quase igual ao do livro de receitas mas, pela primeira vez, consegui fazer essa coisa tão extraordinária e complexa que é molho branco. Pode ser muito simples para muito boa gente, mas para mim que sou leigo é uma tarefa hercúlea. Tanto assim que eu tenho sempre à mão um pacote daquelas bases para molhos, que é a única forma de eu conseguir dar com o dito feito sem percalços irritantes, tais como a farinha não dissolver, ficar tudo agarrado ao fundo, queimar o tacho, inundar o fogão de leite ou entornar farinha pela bancada, chão e demais partes da cozinha que possam estar ao meu alcance. Tenho a informar com orgulho que nada disso aconteceu - e o assado ficou delicioso!
Quarta é o meu primeiro dia de rega às plantas da Vanessa. Não, não têm hora marcada, mas têm dia marcado - e a Vanessa telefona à noite a perguntar como correu a lida... depois conto-vos!
Boa semana!

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Mudança de turno

A minha saga da rega está prestes a começar. Amanhã vou-me encontrar com a funcionária de turno para recolher o acesso às instalações. Ou seja, vou-me encontrar com a amiga da Vanessa que tem executado tão complexa tarefa na última semana. Pois é, não pensem que a Vanessa deixou o seu rico jardim totalmente a meu cargo. Pelo contrário. Elaborou todo um plano de manutenção, segundo o qual dois aprendizes de jardineiros – a amiga e eu – partilharão a tarefa consoante as suas disponibilidades. Assim sendo, coube à amiga proceder à rega duas vezes e a mim três. Como a tal amiga ainda lá vai amanhã de manhã, eu só começarei a faina na próxima Terça. Votos de um dia viçoso!

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

O queixume

Ultimamente não tenho grande paciência para certas pessoas. Que são umas queridas e eu adoro do fundo do coração, mas francamente anda-me a faltar a pachorra. Se calhar sou eu, mas não ficam um bocadinho fartos de ouvir bocejar e suspirar em modo permanente? Eu fico. E não ficam um bocadinho sem paciência ao ver caras de enjoo, estilo toda a gente lhes deve e ninguém lhes paga? E não vos dá cabo da cabeça quando queixas com elas se tornam no prato do dia? Mesmo com razões para isso, muitas e várias. Que eu não só compreendo, como partilho. Mas não é lá por isso que me dá vontade de ouvir lamúrias o tempo todo… falta aqui um bocadinho de espírito belga, falta…

O verdadeiro espírito belga - 2

Na mensagem que aqui deixei, procurava ilustrar o espírito belga. O exemplo da violência entre casais – a violência de sexo, como dizem na televisão espanhola – não é propriamente o melhor exemplo, mas dá para ver como reagem os belgas. Como vocês sabem, sou pacifista e acho a violência inadmissível, seja de que tipo for. Violência nem sequer verbal – mais palavrão, menos palavrão, claro. E claro que essa história de “entre homem e mulher ninguém meta a colher”, como dizem nos vossos comentários é tanga…
Mas o espírito belga não é tanga nenhuma. Minutos depois da cena do casal desavindo, vou despedir-me de uma amiga que, imbuída de espírito feminino, me pede para a acompanhar ao carro. Confesso que não acho particularmente excitante quando uma mulher me pede para a acompanhar ao carro. Nem ao metro. Ainda se fosse a casa dela… Prefiro quando me respondem “Não é preciso, eu posso ir perfeitamente” – gosto de mulheres independentes, como já sabem. Chegados ao carro, a pequena avista um McDonald’s e tem uma ideia luminosa:
- E se fôssemos comer qualquer coisa?
- A esta hora? É meia-noite.
Já não é a primeira vez que ela faz destas.
- E então? Está-me a apetecer. Vamos lá, “on se fait plaisir”!
Ok, então vamos lá…
Diante da empregada, o verdadeiro espírito belga emerge em todo o seu esplendor:
- É um menu de peixe, por favor.
Eu só lhe estava a fazer companhia, não tinha nem fome nem vontade de comer. Além de que devia estar em dieta.
- Não comes nada?
- Não.
- Que jeito! Come lá qualquer coisa para eu não me sentir mal.
Se insistes tanto…
- Bem só se fosse um gelado. Mas eu até estou de dieta…
- Ora, também eu, mas estou-me a borrifar. “On s’en fou”. Vais comer só o gelado?
- Já agora, podia comer um panado de frango. Mas depois engordo.
- Que se lixe! Só se vive uma vez.
Face a isto, não me restou alternativa. A gula ficou satisfeita. “On s’est fait plaisir” dizemos os dois. Cá está o verdadeiro espírito belga.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

O verdadeiro espírito belga – 1

Durante o Verão, Bruxelas tem o belíssimo hábito de organizar festarolas de fim de tarde em locais altamente improváveis. Tanto pode ser no centro da cidade, como num bairro residencial com uma praça convidativa. Ou mesmo na praia artificial, que este ano foi montada novamente. O trânsito é fechado. Há comes e bebes (mais bebes do que comes), música até ser noite e muita gente com boa pinta. E, como em qualquer ajuntamento, às vezes há confusão…
Estava eu numa destas festas, em amena cavaqueira com um grupo que tinha acabado de conhecer, quando uma cena de faca na liga desponta mesmo nas minhas costas. Um rapaz decididamente embriagado, algures no final da adolescência, começa a discutir com uma rapariga, sensivelmente da mesma idade. Os olhares dos que estavam à volta – geralmente ainda sóbrios, mais coisa menos coisa – voltam-se para o casal em disputa. Grita daqui, berra dali, a conversa vai subindo de tom. É ele quem faz as vezes de donzela ofendida que quer lavar a roupa suja na praça pública. Ela nem pia. De repente, quando já todos estávamos de sabão Clarim na mão para pôr ordem em tanta roupa suja, toma lá um tabefe. Ela tomba. Ele ajoelha-se e quer assestar-lhe outro. Uma série de rapazes acorre a separar as partes desavindas. Levam o rapaz para fora do recinto e a rapariga volta para o junto do seu grupo de amigos. A paz volta a reinar.
Mas a minha colega, italiana a 100%, está corada que nem um tomate. Já não pode em si de fúria:
- Ele estava a bater na rapariga! Isto não se pode admitir! Bater numa mulher… que pouca vergonha!! É preciso fazer qualquer coisa!
O namorado dela, que é belga a 200%, responde sem alvoroços:
- Já está tudo resolvido. Já os separámos e acabou a cena. Está tudo bem…
Mas a italiana não desarma. Está possessa. Está fora de si e clama por justiça. De preferência, logo ali.
- Mas isto não pode ser! Ele bateu-lhe. É preciso fazer alguma coisa. Aquele grande malandro…
O belga continua na dele. Como se não fosse nada com ele:
- Mas a gente está-se nas tintas. “On s’en fou”. É uma briga de namorados. Amanhã logo se entendem.
Agora ela já não se aguenta. Quer a cabeça do rapaz:
- E ele agora vai-se embora na boa? Não pode ser! Ele tem de ser castigado! Tem de apanhar!
Eis senão quando o belga responde como só eles sabem:
- “Chou chou”, o que é que queres fazer? Não lhe vamos à cara, pois não? Já os separámos, já está tudo bem. Não stresses…
Cá está a maneira belga de agir: não remoer os assuntos. “Laisse tomber” - deixa lá. É a expressão idiomática mais utilizada neste país. Aprende-se nos primeiros meses de vida aqui mas só se compreende muito depois. O belga viu - e bem - que mais violência não levaria a qualquer lado. Para quê preocuparmo-nos com um conflito ao qual se pôs fim? Para quê ruminar num assunto que já é do passado? Sobretudo se não é da nossa conta (e até já fizemos o possível para resolver)? Este é o verdadeiro espírito belga. Gosto. Não gostava, mas aprendi a gostar.
Boa semana e, se algum problema se insinuar no vosso caminho, já sabem como lhe responder... “laisse tomber”, pois claro!

sexta-feira, 30 de julho de 2010

As plantas da Vanessa

Fui ontem jantar a casa da minha amiga Vanessa, a pretexto de aprender a regar as plantas dela enquanto estiver de férias. Há pessoas muito organizadas. Até ontem, eu julgava-me uma delas. Mas descobri que esta minha amiga excede qualquer noção de organização que eu tinha.
Voltei para casa com quatro folhas com um plano detalhado sobre como regar as plantas alheias e ter orgulho na tarefa: um calendário com os dias exactos em que tenho de lá ir, a quantidade de água a pôr nas plantas e o tipo de regador a utilizar. Isto porque há um pequeno regador branco, do qual bebem as plantas da varanda da frente, e um grande regador verde, do qual bebem as plantas das traseiras. Ah, sim, tenho a meu cargo duas varandas, mais a janela do quarto, mais as plantas da cozinha, que são família. Uma é filha da outra e a terceira chama-se Sophia, em homenagem à fabulosa Sophia Loren, pois vem de Nápoles tal como a diva. Além de todas estas, que tenho de regar três vezes durante a ausência da Vanessa, existe ainda a orquídea da sala, que tem de ser regada apenas uma vez durante o meu período de trabalho, mas com especiais cuidados, que incluem deixá-la a marinar na água durante dez minutos.
Dado que este é o meu período de estágio, a Vanessa telefonar-me-á nos dias da rega para saber como correu tão complexa tarefa. Espero estar à altura…

sexta-feira, 2 de julho de 2010

Como despachar um mau cliente em cinco minutos (e sem que ele se aperceba)

A feira oficialmente chegou ao fim e eu estou mais derretido do que é possível imaginar. Trinta graus são muitos graus. E num local sem ar condicionado e com um tecto de vidro e seis projectores de halogéneo a incidirem na mona é o fim da picada. Acho que transpirei em locais onde não sabia que se transpirava. Neste tipo de ocasiões, os homens são sempre quem sofre mais, com as nossas gravatas e blazers e sapatos fechados. Deviam inventar um código de vestuário que banisse tudo isto e democratizasse o uso de sandálias (por que não mesmo havaianas?), pólos e calções - mas não daqueles curtinhos que se usam agora, porque eu já tenho idade para ter juízo.
Hoje uma colega entrou um pânico quando lhe apareceu um egípcio que começou a tocar-lhe no braço e a querer informações que ela não sabia dar. «Vai lá tu se quiseres, eu não volto a pôr os pés no stand enquanto aquele homem não sair de lá». Eu, como bom relações públicas, que sou, lá fui enfrentar a fera. Chego e dou de caras com um senhor com cinco vezes o meu tamanho, uma espécie de Fernando Mendes em versão escura, alapado numa cadeira no interior do stand como se fosse dele. Temos de tratar da situação. Os maus clientes devem-se despachar a alta velocidade por duas razões: fazem perder tempo à organização sem qualquer proveito e tendem a atrair outros clientes maus. Além de, geralmente, encherem os sacos de material que custa dinheiro e deve servir para veicular informação e não para distribuir aos netos. Assim sendo…
- Em que posso ajudar?
- A Lucy já me vem ajudar.
- Não sei se a Lucy vem, mas em que posso ajudar?
- Ela foi buscar uma coisa para mim, mas volta já concerteza. Deve estar aqui perto.
- Não faço ideia se ela volta nem onde ela está, mas de certeza que eu posso ajudá-lo. De que se trata?
- Quero plantar vegetais.
Pára tudo. Já atendi clientes que queriam comprar sofás mas a quererem plantar vegetais é a primeira vez...
- Mas não quero plantá-los na terra.
Ah não, então no ar?
- Quero plantá-los na água. Só na água… mas para isso preciso de máquinas. Muitas máquinas. Os meus vizinhos vão-me emprestar algumas, mas não chegam.
- Que interessante. Mas nós não somos nenhum fornecedor de máquinas para agricultura.
- Mas estão no Egipto.
- Lá isso estamos. Vou já procurar o contacto da organização que trabalha connosco e pode contactá-los directamente.
- Diga-me os nomes das pessoas.
Estás a abusar. Achas que eu sei quem é que trabalha no Egipto?!
- Os nomes das pessoas não constam no sítio web. Mas tem aqui a morada o número de telefone e o endereço web. Expõe o assunto e os colegas terão todo o gosto em ajudar, se puderem prestar assistência nessa área.
- Muito obrigado pela sua ajuda.
- Não tem de quê. Boa sorte para o projecto e um bom resto de seminário.
E pronto, o cliente foi despachado em cinco minutos. Cinco longos minutos debaixo dos seis projectores de halogéneo. Mas não foi o horror que a colega descreveu. O caminho ficou livre para eu ir buscar um café e para outros clientes serem atendidos. E o senhor até saiu contente e agradeceu.

quarta-feira, 30 de junho de 2010

Feira tropical

Estou numa feira onde se espera a nata dos políticos e empresários europeus. Ao todo, os organizadores previam cerca de três mil visitantes. Mas até ao momento, o o convidado mais assíduo tem sido o calor. Estão 30 graus lá fora e devem estar 50 ca dentro. O tecto é de vidro e não há ar condicionado. Pode uma coisa destas? Este vosso amigo pôs-se todo lindo e maravilhoso para falar com os participantes, mas nem sequer o blazer aguenta. Além disso, alguem que tomou o pequeno-almoço antes das sete da manhã está obviamente, necessitado de uma coisa muito siples: comida. Pois acontece que aqui ainda é pior do que no sítio onde trabalho. Lá, as refeições de trabalho só podem ser sandes. Tudo o resto é muito caro. Aqui o coffee break só tem bolachas, ainda por cima pequeninas que nao cabem na cova de um dente. E, como se não bastasse, amargas como o rabo do gato. Para cúmulo, tenho de escrever esta mensagem num teclado francês que tem o A onde devia ter o Q. Acham bem? Eu não...

terça-feira, 29 de junho de 2010

A sabotagem

Estou em crer, aqui só entre nós, que o meu vizinho de cima anda a sabotar a minha organização doméstica...
Acham normal que ao fim de um dia de sol tropical a roupa que eu estendi no dia anterior esteja húmida?? A mesma roupa que, por acaso, até já estava seca de manhã, mas que eu  não tive tempo de tirar da corda? Cheira-me aqui a sabotagem... Já suspeitei do vizinho do lado que rega o jardim todas as noites com uma mangueira que acorda um morto. Mas, dado que o dito cujo habita no rés-do-chão e eu no segundo andar, achei que talvez fosse improvável a água subir até aqui. Por mais potente que seja a mangueira do senhor, ou melhor, a mangueira do jardim do senhor. Dos vizinhos de baixo não suspeito, pois anteontem fui eu que pinguei para o terraço deles. E precisamente no instante em que o vizinho se tinha refastelado numa espreguiçadeira, todo ele em pose de descanso. Com a barriga a bronzear mesmo debaixo da goteira da minha varanda. É o que dá ter uma máquina de lavar que entrou em greve e decidiu não centrifugar. Esta cena dos electrodomésticos com atitude irrita-me. Estão a precisar de saber quem manda aqui. Eles e o malandro que me anda a molhar a roupa...
Quem também precisa de uma lição é o Blogger, este sítio web que gentilmente me acolhe, porque tem um corrector ortográfico que não reconhece «electrodomésticos» nem «espreguiçadeira». Duas coisas tão úteis e ele não sabe o que são...

domingo, 27 de junho de 2010

A importância dos pequenos gestos

Já todos recebemos vezes sem conta aqueles emails da treta com ensinamentos orientais, correntes que andam a circular desde antes de a Internet existir e apresentações que devemos reenviar aos verdadeiros amigos, mesmo que as tenhamos recebido de um ilustre desconhecido que não nos lembramos de alguma vez ter visto.
Mas a verdade é que os pequenos gestos são realmente importantes. Podem mudar o dia de uma pessoa. E transformar a má disposição em boas energias. Vou-vos contar o que me aconteceu.
Há uns dias atrás, cheguei a casa com vontade de torcer o pescoço a quem se atravessasse no meu caminho e cheio de dores em todos os músculos que tinha acabado de exercitar no ginásio, mais naqueles que não tinha exercitado mas que quiseram doer em solidariedade. Puxo das chaves para abrir a porta e qual não é o meu espanto quando vejo um pacote de Portugal na soleira da porta. A minha querida Maggy tinha-me feito uma surpresa, desta eu já sabia, mas os correios fizeram-lhe outra e despacharam a encomenda mais cedo do que o previsto. Como gosto de guardar o melhor para o fim, reservei o pacote para quando sentasse o rabo no meu sofá castanho, devidamente banhado e jantado. Foi com enorme alegria que descobri uma moldura com duas fotografias (sim, duas, porque a Maggy não é mulher de fazer as coisas em ponto pequeno) de um memorável jantar com todo o meu grupo de amigas da pós-graduação. Fiquei sem palavras. Ao fim de um dia em que não devia ter saído da cama receber um presente já é extraordinário. Mas compreender que alguém pensou especialmente em nós, se deu ao trabalho de ir revelar a fotografia à Worten, escolheu uma moldura e enviou-a pelo correio para um dos fotografados é demais. Esqueci-me imediatamente do que tinha corrido menos bem nesse dia, aliás também me esqueci do que tinha corrido bem e de tudo o que tinha feito até àquele momento. Porque a felicidade que tomou conta de mim foi maior do que tudo o resto. Maggy, não sabes o bem que me fizeste. São assim os amigos. E eu sou uma pessoa de sorte por ter tantos e tão bons.
Beijinhos e boa semana!

Como preparar um jantar para dois em 15 minutos

A minha Mãe costuma dizer que sou um bocado lento. Não tenho reflexos rápidos, é verdade. No outro dia, até o monitor do ginásio me dizia: «O seu corpo é um bocado lento, tem de lhe imprimir mais ritmo». Mas hoje surpreendi-me com a minha própria rapidez.
Acaba de sair de minha casa uma amiga que veio para jantar. O dito estava marcado para as 20h00. Às 18h25, depois de comprar um bronzeador para os banhos de sol de amanhã, entro no Carrefour. Às 18h45, termino as compras e junto-me à fila da caixa. Nada estava preparado. Dez pessoas à minha frente. Às 19h00, continuo na fila e até ainda estou no mesmo sítio. Às 19h20, decido enviar uma mensagem à minha amiga: «Podes vir às 20h30, que eu estou um bocado atrasado?» «Ok». Finalmente, às 19h30, este vosso amigo paga as compras e acarta com as ditas cujas para casa. Escusam de perguntar se é preciso 45 minutos para atender dez pessoas. Se alguma vez entraram num Carrefour em Portugal – todos padecem da mesma doença – sei que me compreendem.
Às 20h00 em ponto, a mesa está posta, o jantar pronto e eu até já estou vestido. Menu: tâmaras com bacon, macarrão com queijo e fiambre e gelado. Até tive tempo de pôr uns salgadinhos na mesa de centro. E perguntam vocês: «Mas como???»
É simples. O meu professor de marketing da faculdade dizia que a melhor maneira de obter uma coisa não era fazê-la. Era roubá-la. A segunda melhor maneira de a obter era comprá-la. E só não podendo escolher nenhuma destas alternativas se fazia. Eu comprei. Aprendam para o vosso próximo jantar. Comprem o macarrão já pronto, coloquem num pirex bonito e acendam o forno quando os convidados tocarem à porta. Mesmo que tenham cozinhado a massa no micro-ondas, essa prestimosa máquina a que ninguém dá valor, finjam que aquecem no forno, que não tem grande préstimo, leva horas a aquecer e gasta luz que se farta, mas toda a gente acha mais saudável. Mesmo os que não sabem ligá-lo. Enquanto a massa cozinha, retiram o caroço das tâmaras as tâmaras - bem sei que em Portugal se vendem tâmaras desencaroçadas, mas aqui no século XIX ainda não. Tiram a massa do micro-ondas, enfiam lá as tâmaras e aproveitam este intervalo para pôr a mesa, ligar a música e abrir o vinho. E vestirem-se, caso sejam como eu e tenham feito tudo o resto em roupa interior para gáudio da vizinhança. Às 20h00, a minha convidada manda uma mensagem avisando que está atrasada. Bom, vou aproveitar para estender roupa. Às 20h30, está perdida. Assim sendo, vou pôr mais roupa na máquina e fazer uns telefonemas. Às 21h00 aterra finalmente à minha porta e eu pergunto a mim mesmo para que é que andei a correr feito tresloucado sem necessidade. Mas o resultado não deixa dúvidas: «Este macarrão está óptimo! Que bem que cozinhas!!!»…

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Desculpe, isto é açúcar?

Há pessoas que nunca devem ter entrado num supermercado. E que, provavelmente, também nunca fizeram comida na vida.
Ontem fui ao supermercado na esquina da minha rua. Precisava de aprovisionar devidamente a dispensa, porque a minha família chega amanhã. Tinha-se acabado a massa, os legumes, o papel higiénico, o leite, o pão e demais mercearias que deviam nascer nas despensas e emigrar para as cozinhas por iniciativa própria. A arca congeladora estava meia vazia, o frigorifico quase vazio e a dispensa estava cheia… de garrafas de vinho e tupperwares vazias.
De modo que lá peguei no meu carrinho de compras como fazem as pessoas de idade e estava diligentemente de lista na mão quando um senhor me interpela:
- Desculpe, fala Inglês?
- Sim, precisa de ajuda?
Nisto, ergue um frasco de detergente da louça.
- Sim, isto é detergente da louca?
Se tem cor de detergente da louça e esta no lugar dos detergentes da louça e vem dentro de um frasco de detergente da louca, talvez seja detergente da louça. Mas nunca fiando…
- Para lavar os pratos.
- Pois, o detergente da louca serve para lavar os pratos.
Pelos vistos, a coisa ainda não lhe está clara na mente.
- À mão – explico eu –, não é para a máquina da louça…
- Ah…
Acontece. Algumas pessoas nunca lavaram louça. Eu vivi com uma rapariga que não sabia que o chão se lava com detergente nem nunca tinha cozinhado, portanto já devia imaginar que há pessoas que nunca lavaram louça. Mas a contenda não ficou por aqui. Imediatamente o senhor mostra-me um pacote de açúcar.
- Já agora, sabe-me dizer se isto é açúcar?
E já agora, não me quer dizer onde estacionou a sua nave espacial?

terça-feira, 11 de maio de 2010

Só para esclarecer

Só para esclarecer: o que me faz impressão não é ajudar a Grécia, pois a União Europeia construiu-se na base da solidariedade. Como europeísta convicto, acredito que nos devemos ajudar uns aos outros em nome do bem comum. Como disse a Angela Merkel, a Grécia é um dos nossos e não a podemos deixar cair.
O que me incomoda é que tudo se faça em função dos caprichos dos especuladores e dos desejos das agências de rating. Estes pressionam os mercados, ameaçam subir os juros da divida e, já está!, tomem lá mais uns cobres para sossegarem. Tudo se resolve com mais dinheiro. Ninguém pára para pensar que, mais tarde ou mais cedo, a Grécia e a Europa por junto hão-de ter de repor o dinheiro que agora disponibilizam. Ou seja, as gerações vindouras já nascerão endividadas. As contas bancárias dos contribuintes não são bolsos sem fundo… parecem, mas não são…
No auge da crise (não esta, mas a anterior), alguém dizia que era preciso rever o sistema financeiro que tinha levado ao colapso. Era fundamental questionar alguns dos actores que intervinham no dito cujo. E chamá-los à responsabilidade. Mas agora essas vozes já não se ouvem… agora só se ouvem os peritos, os políticos e as autoridades a exigirem mais euros… muitos milhões de euros…

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Expliquem lá melhor, mas agora como se eu fosse muito burro

Continuo a ver televisão, a acompanhar os jornais e a ler os comentários das minhas visitantes habituais, mas não há meio de entender. Sei que há uns especuladores e umas agências de «rating» e umas bolsas que têm de ser satisfeitos dê lá por onde der. Também sei que a Europa não pára de pôr dinheiro na mesa. Ainda não percebi é por que é esses amigos têm de ser acalmados e por que é que o nosso dinheiro é disponibilizado sem parar para acalmar a inquietação dos ditos cujos. Expliquem lá melhor, desta vez como se eu fosse muito burro…
A União Europeia acaba de disponibilizar 500 mil milhões de euros para, segundo os noticiários, «estabilizar o euro». Um plano gigantesco e inédito, que, nas palavras de outros especialistas, irá «salvar a moeda única». Isto foi hoje de madrugada. Durante o dia, graças a este excepcional envelope de dinheirinho fresco, já está tudo bem outra vez. Os mercados estabilizaram, a bolsa portuguesa registou a maior subida de sempre, a de Madrid cresceu 10% e os juros da dívida portuguesa desceram. E, como a festa não ficaria completa sem todos os convivas, os EUA deram um ar da sua graça e Wall Street foi contagiada pela euforia europeia. O FMI saudou as medidas anunciadas. Por acaso, umas horas antes, Barack Obama tinha expressado a sua preocupação com a situação da Europa em geral e da Grécia em particular. Fica por saber se a dita preocupação significa vontade de ajudar ou apenas a conversa do costume. Entretanto, como a situação já voltou ao normal, Obama terá certamente posto o assunto de lado para se preocupar com temas mais urgentes e inadiáveis, tais como o papel da Xbox na evolução da democracia.
Mas, enquanto os mercados entram em euforia e o resto do planeta se regozija com o plano multimilionário, a tesoura dos governos não pára de atacar a despesa. A sociedade? Que aguente e é se quer! O Ministro das Finanças admite que poderá aumentar os impostos. Os ex-ministros das Finanças, esquecidos de que ocuparam esse cargo, avisam para medidas mais drásticas. O Vítor Constâncio, com o seu talento único para criticar o ordenado alheio sem falar no próprio, quer que o défice desça mais. E já este ano. O pessoal que se aguente à bronca e nada de vir armar confusão como os doidos dos Gregos.
Esta perturbadora realidade recorda-me do 11 de Setembro e da recessão económica que se seguiu. Nesse dia, o António Perez Metello teceu um comentário muito elucidativo, que rezava mais ou menos assim: «As torres caíram, mas, excepção feita às que desapareceram na tragédia, as empresas continuam de pé, as pessoas vão voltar ao trabalho e a economia pode retomar o seu curso. Mas tudo depende do que os mercados dirão». Vários anos depois do 11 de Setembro, veio a crise financeira que começou na América e contagiou a Europa. Muitos países endividaram-se até à medula. A Islândia faliu. As tais agências de «rating», porém, continuaram impávidas e serenas a brincar com os ditos «ratings» e nós a pagarmos. Poucos meses antes do colapso, estas amigas consideravam a Islândia um país seguríssimo para investir. Também não se sabemos estas queridas onde andavam quando a América deixou falir o Lehmann Brothers. Aliás, nessa altura a quantidade de agências, institutos e demais garantes do bem comum que estavam em sono profundo devia ser enorme, porque o FMI, que agora dá sentenças a torto e a direito, também estava ausente do escritório. O Barack Obama, por sua vez, estava ocupado com a campanha eleitoral, que, ao contrário da Xbox, é boa para a democracia.
Quando o G20 se juntou para resolver a tal crise que veio do outro lado do Atlântico, uma analista espanhola disse que, quando saíssemos da dita cuja, a economia teria irremediavelmente de se reconstruir de outra forma. Mais cuidadosa, mais sustentada e menos sujeita aos caprichos dos especuladores. Mas, dois anos depois, estamos de volta ao ponto de partida: os especuladores estão inquietos, os mercados pressionam e os rumores multiplicam-se. E lá vão os mesmos de sempre pagar a factura. Os mesmos pagadores que continuam à mercê dos mesmos especuladores. Nenhuma das tais agências distraídas mencionou que fechou uma fábrica em Portugal onde 900 pessoas perderam o emprego. Nem que o desemprego na Europa não pára de subir. O que interessa isso comparado com a pressão dos especuladores? Não interessa nada…

terça-feira, 4 de maio de 2010

Expliquem lá melhor

Os problemas que não se resolvem voltam sempre para nos atazanar. E, geralmente, voltam pior do que da primeira vez.
A crise na Grécia dá-me para pensar. Aliás, não é só a crise na Grécia, porque, segundo os jornalistas, a Espanha é hoje o novo alvo dos especuladores. «As bolsas europeias fecharam no vermelho por causa dos rumores sobre uma eventual ajuda europeia à Espanha». «Wall Street em queda por causa da instabilidade na Europa». «Economistas admitem que Portugal pode precisar de ajuda». «Steiglitz diz que está a chegar o fim do euro». Eu não sou especialista, mas, se bem percebi, a Grécia vai pagar juros mais altos pela sua dívida. OK. Porque o défice é maior do que o previsto. Percebo. As agências de rating mudam o rating da Grécia. Pois. Os mercados entram em paranóia. Não sei se consigo acompanhar. Por isso, a Europa – que somos todos nós – vai emprestar uma pipa de massa à Grécia. Como é que é? Expliquem lá isso melhor…
É impressão minha ou nós vamos emprestar uma fortuna à Grécia porque os mercados enlouqueceram e os especuladores precisam de se acalmar? Ou melhor, para assegurar a acalmia dos mercados, vamos até pôr a hipótese de dar uma ajudinha à Espanha. Que até há uns tempos atrás era toda saúde. Ah, e já agora, como o bolso dos contribuintes é sempre mais fundo do que a ganância pode imaginar, vamos lá também emprestar umas massas a Portugal, para que não haja descriminações entre os PIGs. PIGs ou PIIGs é um acrónimo de mau gosto com que aqui se designam os países da coesão: Portugal, Irlanda, Grécia e Espanha.
Em troca do apoio europeu, a Grécia vai arrumar a casa e pôr ordem nas finanças públicas. A receita é a mesma do costume: os funcionários públicos vão ter os salários congelados, os pensionistas vão ter reformas mais baixas, o IVA aumenta, corta-se na saúde e na educação (nunca nos ordenados dos políticos, claro) e um dia, com boa vontade de todos os envolvidos, lá se há-de pagar o tal empréstimo. Nem que tal demore gerações a fio. Agora o que é preciso é acalmar os mercados. Daqui a uma décadas, pensamos nessa cena de pagar o empréstimo. Agora é urgente tranquilizar os especuladores. Deixem lá os pobres, os desempregados e a classe média, que agora não interessam nada… O que interessa é que as agências de rating não reduzam a classificação da dívida soberana. Mesmo que, para isso, a soberania dos países se esvaia no fumo das especulações…