domingo, 23 de novembro de 2008

O taxista, os cartões e… o pão!

Ao ler este título, perguntam vocês e com razão se me inspirei no filme A Vida, o Amor e as Vacas, onde nada do que consta no título tem a ver com nada, mas ninguém quis saber e assim intitularam o filme. Neste caso, verão que tudo o que figura no título desta mensagem está interligado por um fio condutor: a Bélgica que eu vou dando a conhecer.
Os taxistas, que provavelmente não lêem o meu blogue, têm geralmente reputação de pessoas pouco simpáticas, mas ocasiões há em que este lugar-comum ultrapassa qualquer limite. Estava eu a sair do aeroporto de Bruxelas, exaurido pelo nocturno voo que me transportou de Lisboa, quando tento entrar num táxi. E digo «tento», porque na realidade o taxista me recusou ou, como diríamos no meu trabalho, me reencaminhou para o táxi mais adequado. Parece que o meu bairro era demasiado longe para o senhor. Ao longo da viagem, vou dando algumas indicações ao condutor, pois habitualmente perguntam-me que caminho devem seguir e onde exactamente é a rua. Subitamente, ao aproximarmo-nos da minha zona, o senhor exclama rudemente: «Eu faço isto há 32 anos, não preciso que me dê indicações!» Apesar da estupefacção que se apodera de mim, eu lá peço desculpa e explico que muitos colegas me perguntam indicações. «Mas eu não perguntei, pois não? E o senhor vem a dar-me indicações desde o aeroporto e eu não preciso delas para nada!». Livra, que é malcriado! Está uma pessoa a pagar para nos transportarem, dá-se ao trabalho de ajudar e é esta a paga. Nem dois minutos depois, estava-me a perguntar onde era a minha rua… Que bela impressão para quem acaba de chegar a um país, sinceramente… O que vale é que as malas chegam ao tapete do aeroporto primeiro do que os passageiros, ao contrário de Lisboa, onde aterrei naquele terminal novo dos voos domésticos – onde é que esta gente tem a cabeça?? - aguardei horas para as portas abrirem, mais horas para nos levarem ao aeroporto propriamente dito e ainda mais para chegarem as malas!
Quando cheguei a Lisboa, esperava por mim um novíssimo cartão bancário, o tal que o multibanco conspirador me comeu. Foi com enorme surpresa que descobri que agora estes cartões têm um chip para maior segurança! É que aqui na Bélgica, onde os multibancos não abundam, os bancos devem imenso à eficiência (e agora também ao Estado) e os serviços são tudo menos exemplares, mesmo os cartões mais simples já têm chip há muito tempo…
Mas a mais inesperada das coisas positivas que descobri ao regressar a Bruxelas não tem nada a ver com bancos nem taxistas. Tem a ver com algo do domínio prático muito mais essencial à vida: o pão. Não se enganaram, meus amigos, leram mesmo «o pão». E a que propósito se fala aqui de pão? Pois tinha eu acabado de entrar no meu apartamento e tirado o casaco quando me ocorre que não tenho pão para o pequeno-almoço do dia seguinte. Paciência, come-se na rua, que é que se há-de fazer às tantas da noite? Eis senão quando me lembro de ter deixado algumas fatias no armário. Lá vou indagar do estado das ditas cujas, na convicção absoluta de que estarão bolorentas ou, no mínimo, rijas que nem pedra. Abro o saco de papel e – surpresa das surpresas – o pão, que tinha sido comprado há semana e meia, estava óptimo e pronto a ser comido. Quem diria?
Hoje nevou todo o dia aqui em Bruxelas, deixando os carros e os passeios cobertos de branco. Espreitem o vídeo que filmei, está do lado esquerdo. Agora não há margem para dúvidas!
Boa semana!

sábado, 22 de novembro de 2008

Notícias do Pólo Norte

Prezados amigos, venho por este meio informar que a Força do Destino se transferiu de armas e bagagens para o Pólo Norte, de onde vos escrevo esta mensagem. Neste local ermo do nosso planeta, a temperatura é de um grau positivo, mas, como diz o tal sítio inteligente da Internet, sente-se como se estivessem três graus negativos. Como seria de esperar no Pólo Norte, tem nevado ao longo de todo o dia em quantidades abundantes que só não se acumulam porque a chuva é mais persistente e faz a neve dissolver-se. Não acreditam? Ora então vejam as fotos que se seguem…

Já sabem que falta de nitidez é culpa do telemóvel, mas eu garanto que nevou: não só vi muitos e gordos flocos de neve, como andei na rua a apanhar com eles em cima! Para animar a festa, o meu predilecto sítio web da meteorologia prevê que a temperatura desça efectivamente abaixo dos zero graus durante a próxima semana, por isso aqui continuarei a gelar e congelar até que o São Pedro decida repor a normalidade climatérica e devolver-me à Europa. Pensando bem, não sei se é o São Pedro que se ocupa da neve e do frio, mas concerteza saberá para quem reencaminhar este pedido que a Força do Destino encarecidamente lhe dirige.
Esta vida de andar entre dois países dá muito que pensar. E a mim deu-me não só para pensar como também para concluir – o que já é uma tarefa de monta – que razão tem o povo quando diz que não há sol na eira nem chuva no nabal. Deu-me para esta conclusão quando voltei de Lisboa e revi mentalmente uma série de coisas boas e más com que me deparei no nosso país e ao regressar a Bruxelas.
Como se recordarão de anteriores mensagens, as lojas em Bruxelas não são propriamente famosas em termos de atendimento. Há duas semanas, eu tentei em vão comprar um casaco de lã cinzento que experimentei na Zara. Ocorre, porém, que não tinham o meu número. O que é que faz nestas situações? Pede-se a um dos empregados para verificar se o dito cujo existe. Na primeira vez em que o casaco se atravessou no meu caminho, até era o meu número mas tinha as mangas diferentes e faltava-lhe um dos botões. Será que há um em condições noutra loja? Não é pedir muito que o verifiquem, pois não? Afinal, em Portugal qualquer Zara que se preze o faz por nós. «Peça ali à minha colega da caixa que ela vê». Óptimo, aqui fazem o mesmo. Chegado à caixa, esbarro nesta resposta: «Eu, ligar para outra loja? Não, não posso. Mas o senhor pode!». Ora que eu posso também eu sei, estava-lhe era a pedir se o fazia. «Mas é por o casaco não ter um botão? Não se preocupe, eu ofereço-lhe outro». Oferece-me outro? Mas está parva ou faz-se? Devia-me era fazer um desconto para eu levar uma peça desvirtuada! «Depois o senhor chega a casa e põe o botão». Claro, oferecer a possibilidade de o pregarem na loja era pedir demais. «E vende-me o casaco mais barato?» pergunto eu. «Mais barato? Por quê?? Eu já lhe estou a oferecer o botão!!» Desisto…
Como vocês sabem, eu sou muito persistente e quando encontro uma peça de roupa de que gosto sou… ainda pior! De modo que corri meia Bruxelas em busca do casaco e, na falta do meu número, decidi repetir a cena numa loja da baixa. «Pode-me ver se tem o M deste casaco? Não há nenhum aqui». Desta feita, encontrei um rapaz que respondeu prontamente: «Não quer levar antes o de algodão?» Se eu quisesse levar o de algodão, tinha pegado nele e levado, não achas imbecil? E para que é que me serve um casaco de algosão numa terra onde está um grau de temperatura? «Então vou procurar no armazém». Foi mas só voltou passado vinte minutos para me dizer que do dito cujo nem rasto.
Traz-nos esta aventura para Lisboa, onde finalmente encontrei o célebre casaco nessa instituição fabulosa que é o Oeiras Parque. Nem foi preciso procurá-lo, bastou dizer o que queria à menina da caixa, que, por sua vez, fez sinal ao menino que arrumava a roupa, que rapidamente o trouxe. Notem bem que ninguém me disse «vá ali à minha colega», nem me mandou telefonar nem me tentou oferecer botões para eu pregar...
Amanhã vos contarei mais pormenores curiosos e outros verdadeiramente surpreendentes desta Bélgica transformada em Pólo Norte. Boa noite!

Lar doce lar

Depois de cinco dias na nossa encantadora Lisboa, a Força do Destino está de volta e mais reforçada do que nunca… Até porque, bem vistas as coisas, daqui por um mês voltamos a fechar a loja e a embarcar para terras lusas!
Antes de mais, vamos fazer de conta que estamos nos Óscares, acabamos de ser agraciados pela Academia e subimos ao palco para agradecer: eu quero agradecer à minha família e aos meus amigos que me deram a honra da sua companhia ao longo dos últimos dias! Quero dedicar esta estatueta à minha querida família, porque não há palavras que descrevam a alegria que é estar convosco e o quão importantes são para mim. Bem hajam! Quero também partilhá-la com os meus amigos, alguns dos quais não via desde que iniciei a minha carreira internacional, e que tive o genuíno prazer de reencontrar – e de descobrir que os laços que nos unem não se desfazem apesar da distância física que nos separa.
Não é preciso estar aqui para saber que não há como a nossa casa. Todos o sabemos, mas é quando estamos longe dela que esta percepção mais se agudiza. E quando digo casa, estou a pensar nas várias casas que podemos ter. Em primeiro lugar e mais do que nunca, o meu maravilhoso apartamento, que é o sítio mais perfeito do planeta e agora se tornou na casa da Mãe, segundo a própria. Ali tudo está sempre impecável, tudo é confortável e há sempre espaço para tudo. A única coisa que não abundava quando cheguei era calor, mas o calor humano é sempre tanto que o resto não importa. Mas, além das nossas estimadas paredes, outra casa nos provoca saudades: a nossa querida Lisboa, onde o sol brilha, a chuva escasseia e toda a gente fala a nossa língua! É que esta cena de trabalhar num idioma que não é o nosso, viver num país onde se falam dois idiomas que também não são os nossos nem para lá caminham e conviver em idiomas que nos são igualmente estranhos dá conta da cabeça a qualquer um!
Porventura já se esqueceram mas nós estávamos nos Óscares, verdade? E o espectáculo não pode parar, porque tempo é dinheiro e ainda mais agora que estamos em época de crise. Assim, neste preciso instante, a orquestra começa a tocar, a Jodie Foster dá-me o braço para me levar para os bastidores e o comentador de serviço faz um breve resumo do que foram cinco dias em Portugal, enquanto o programa é interrompido para um intervalo publicitário.
Nestes cinco dias, tive direito a um magnífico jantar de aniversário antecipado, a um estupendo almoço de aniversário na véspera, a um belíssimo almoço de aniversário repleto de picanha e a um fabuloso jantar de aniversário duplo. Obrigado a todos os que estiveram presentes, telefonaram, mandaram sms e enviaram e-mails, foi óptimo saber que se lembraram deste vosso amigo. O jantar de aniversário foi duplo porque a Dulce, que também visita este blogue, assinalou uma data particularmente especial e, como tal, comemorámos a dobrar. Não digo qual porque a idade das senhoras não se diz, mas posso afiançar que para o ano que vem serei eu a comemorar uma idade memorável… 30 anos! Já viram como o tempo passa?
Para além destes felizes acontecimentos, também ocorreram algumas peripécias, começando e acabando no aeroporto, onde o avião até aterrou a horas (pasme-se!) mas esperei quase uma hora pela mala. No regresso, o dito cujo aeroporto tentou mesmo boicotar-me e devorou-me um cartão multibanco novinho em folha. Aliás, os multibancos não foram nada hospitaleiros durante esta estadia: então não é que outro deles me engoliu dinheiro e teve a lata de me dar um talão a dizer «depósito não efectuado»? Ainda por cima, era o presente da minha tia…. Que por acaso lê este blogue… mas já está tudo resolvido! Será que os multibancos estavam estão todos feitos uns com os outros? Será??!! Ah pois claro que estão! De repente, vem-me à memória a entrevista do Dias Loureiro à Judite de Sousa esta noite e agora é que eu percebo tudo. Os multibancos estão a conspirar contra o BPN, porque eles pensaram vender umas máquinas alternativas aos ditos cujos e eles agora estão-se a vingar. O pior é que me apanharam pelo meio, logo eu que não tenho nada a ver com o dito banco. Ou pensando bem, até tenho, eu e nós todos, porque é o nosso rico dinheirinho que vai tapar o buraco orçamental dos não sei quantos milhões de euros. E que história vem a ser esta do Banco Privado Português querer aproveitar as garantias do Estado ou o aval ou lá como é que se chama? Dizem que têm falta de liquidez… então mas eles não gerem grandes fortunas? Por este andar, eu também quero um aval ou uma garantia ou outra coisa qualquer que signifique carcanhol a vir na minha direcção. Para quê? Ó meus amigos, nem sequer perguntem: eu vivo na Bélgica, está um frio que não se pode e ainda me perguntam para quê?
Pois é… esqueci-me de falar no tempo. Aqui, ao contrário da nossa radiosa Lisboa, a temperatura é de um grau. E como nos avisa um sítio muito inteligente da Internet, é um grau que parece menos três. Consta mesmo que amanhã poderá nevar e que Domingo os ventos serão fortíssimos. Enfim, se este blogue for particularmente produtivo durante o fim-de-semana, escusam de se interrogar por quê!
A pedido de várias famílias, vou repor a Mamma Mia assim que puder. E deixo-vos também Esta Lisboa Que eu Amo - não a versão original da Simone, mas uma reinventada por uma tuna. Digam lá que não sou original!

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

À mesa

Já vos contei algumas aventuras que ocorreram na China mas ainda aqui não se abordou devidamente um assunto absolutamente incontornável quando se fala em tal país: a comida.
Comer na China tem muito que se lhe diga e nem sequer me estou a referir à comida em si. Estou a pensar, como é óbvio, nos pauzinhos. Bem podem dizer que a comida chinesa não sabe ao mesmo se não usarmos pauzinhos… Aqui só entre nós, não há nada como os talheres, essa invenção de excepcional utilidade que transformou o acto de comer de coisa bárbara e alarve num momento de prazer gastronómico. Ora os chineses devem estar algures entre estas duas fases, porque não só nos dão pauzinhos como uma colher de louça. O que, já se vê, é extraordinariamente útil, porque, além de servir para comer a sopa, dá para empurrar os alimentos para a dita cuja e assim evitar que fiquemos a olhar para eles como boi para palácio. Neste aspecto, ficamos, pois, completamente descansados. Aliás, basta ir aqui à cantina para ver que há muito boa gente a comer só com o garfo, por isso por que é que não se há-de comer só com a colher e dois belíssimos pauzinhos?
Quem for à China também poderá ficar descansado se almoçar e jantar sempre e só onde a agência de viagens o levar e, já agora, se a viagem incluir todas as refeições. Digo-vos isto porque na generalidade dos restaurantes aonde fomos em grupo a comida era muito semelhante à comida chinesa que comemos em Portugal, com a desagradável diferença de que as doses tinham dimensões muito mais reduzidas. Na mesa, que era sempre redonda e onde havia sempre uma parte giratório no centro, os pratos eram sempre numerosos. As quantidades que lá estavam dentro é que não. E a sobremesa, então, nem sei que vos diga. Era sempre melancia, à razão de um terço de fatia por pessoa. Como diziam alguns viajantes, não era para comer, era para lavar os dentes…
Mas ir apenas aos restaurantes onde as agências nos levam não tem piada nenhuma. Aliás, fazer apenas o que eles dizem é uma seca brutal, de modo que a malta, que é revolucionária e curiosa por natureza e já tem muita tarimba neste sector das viagens, está sempre pronta a explorar novos caminhos! Às vezes o resultado não é o melhor, mas nada que nos intimide. O problema principal é que em nenhum restaurante se fala Inglês. Ou, de outro ponto de vista, nenhum de nós falava Chinês. Tudo isto levou quatro turistas a passarem mais de meia hora à mesa em Guilin, a olhar para um enorme buffet com olhos de gula e rodeados por uma dúzia de empregados a tentarem articular qualquer coisa. É que eles, além de não falarem Inglês, ou não percebem ou fingem que não percebem que nós não percebemos e, assim, continuam a falar. Mais: chamam os colegas, que por sua vez chamam outros, que chamam ainda outros, numa vã tentativa de se fazer entender. Com todas estas almas orientais em torno de nós e votados à ignorância face ao que diziam, lá apontámos para o bife mais fotogénico da ementa, sempre a invejar o dimensionado buffet no centro do restaurante. Já o bife ia a meio quando finalmente uma guia que estava noutra mesa nos interrompe simpaticamente em Inglês: «O empregado só vos queria dizer que podem comer tudo o que quiserem do buffet chinês, não pagam mais». Ó minha amiga, nem se pensa duas vezes. Escusado será dizer que do bife nem mais um naco marchou…
A propósito de bife, importa realçar que nem sempre o que conhecemos é de fiar. Em Xangai, decidimos pela primeira vez provar o que eles designam por «comida ocidental»: entrámos num restaurante aparentado a pizzaria, onde, como convém, até havia pizzas e aventuramo-nos numa Quatro Estações. Não é preciso ser nenhum especialista em cozinha italiana para saber que esta pizza leva ingredientes diferentes, cada um dos quais está, regra geral, disposto num quarto da pizza. No entendimento chinês, a Quatro Estações só tem tal nome para enfeite, porque também poderia ser Oito Estações ou até dezasseis. É tudo uma questão de imaginação. Afinal tudo quanto estava à mão na cozinha se espalhou lá por cima: camarão, mexilhões, fiambre, atum, lula, ananás, cogumelos, azeitonas, carne picada, brócolos, couve-flor e o mais que vos possa passar pela cabeça. Mas se é verdade que o que conhecemos nem sempre merece confiança, já o desconhecido pode ser muito apetitoso. Em Xian, a opção quase unânime foi pela carne de aves, mas houve uma destemida que se inclinou para as pernas de rã. E adivinhem lá quem acertou? Efectivamente, as pernas de rã eram deliciosas, além de serem precedidas de sopa e seguidas de sobremesa. Quem se ficou pelos pratos habituais, não teve direito a mais!
Mas o melhor da história, em termos gastronómicos, ainda está por contar. Era uma vez um grupo de quatro turistas com tendências independentistas que decidiu jantar na zona típica de Guilin. Nessa noite, porém, vários outros viajantes do grupo se lhes juntaram e lá foram todos em demanda de uma mesa adequada, que encontraram em plena rua. Visto o menu à lupa, este vosso amigo achou logo por bem provar um prato que nunca tinha provado antes: pombo. Já o resto do grupo optou pelo porco doce. Só que, como diz a minha tia desde que jantou no Planet Hollywood, já não se pode confiar no frango, uma coisa tão honesta que se podia comer em qualquer lado porque era sempre igual. Desta vez, perdeu-se a confiança no porco doce. Em lugar do porco que conhecemos dos restaurantes chineses da nossa terra, surgiu uma dúzia de fatias de entremeada do mais gorduroso que possam imaginar, acompanhadas de várias dúzias de amendoins… Razão tinha eu ao escolher o pombo, que se apresentou à mesa de cabeça e tudo, para que não restassem dúvidas de que era quem dizia ser. Sim, pegaram no bichano por inteiro, assim o assaram e assado o puseram no prato. Surpreendente!
Já estou de malas aviadas para vos ir visitar. Hoje a cena habitual da mala que demora a noite toda a fazer não se repetiu, de modo que tudo está a postos para seguir viagem rumo a… Lisboa! Até já!

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

O centro comercial

Hoje faço uma pequena interrupção na viagem à China, que nos deixou entre Pequim e Xangai, para vos contar como é fazer compras em Bruxelas. Tarefa árdua, mal compreendida e altamente dificultada por quem está do lado de lá de um balcão ou do lado de dentro de uma loja. E mal-amada também pela classe política aqui do burgo. Mas fundamental para que a economia se recomponha e funcione – e se há algo de que a economia mundial necessita é mesmo de se recompor! Claro está que se nenhum país está livre da crise, a Bélgica também não. Mas nem mesmo assim a coisa se torna mais fácil. Políticos desta terra, leiam o meu blogue! Comerciantes deste país, ouçam os meus conselhos! Haverá alguém que tome medidas?...
Tudo começa com os horários. Os horários são uma maçada tremenda, porque uma vez estipulados, têm de ser cumpridos. E, como toda a gente sabe, obedecer a horários implica chegar a horas, o que, evidentemente, é uma canseira ainda maior. Agora até nem estou a gozar, porque como todos sabem, a pontualidade não é propriamente o meu forte. Ora aqui no coração da Europa, os horários de abertura das lojas são tão parecidos com os nossos como a água e o azeite. O pequeno comércio, que abunda aqui no meu bairro, abre quando quer e lhe apetece. O frachising de uma famosa cadeia de lavandarias (isto aqui é como na televisão, não se pode dizer marcas a menos que paguem) abre às 7h00 e fecha às 18h00, o que é um abuso brutal mas dá um jeitão porque a malta não consegue sair muito antes das 18h00 e assim passa lá de manhã a deixar os fatos para limpar a seco. Fecha aos sábados e domingos, ao passo que a lavandaria da mesma empresa no meu bairro português abre ao Sábado. O café em frente abre às 7h30 e fecha às 15h00, porque, como hão-de entender, alguém terá de compensar o exagero de horas laborais despendidas pelos senhores da lavandaria. A outra lavandaria, que não é de nenhuma cadeia internacional mas tem uma empregada muito mais simpática, abre às 10h00 e também fecha às 18h00. Abre ao Sábado até às 12h00, coisa absolutamente inútil porque, assim como assim, estamos todos a dormir e, se por um mero acaso, estivermos acordados e, por um acaso ainda mais remoto, pensarmos em roupa, é porque vamos entrar no banho e convém escolher o que vestir primeiro. Os supermercados abrem às 8h30 e fecham às 19h30. Ambos fecham ao Domingo, excepto um mais pequeno, onde os produtos são os mesmos porque é da mesma cadeia mas os preços são mais elevados. A bem do rigor, cabe notar que quando eu digo que uma loja fecha às 19h00 significa, como se lembrarão de mensagens anteriores, que às 19h00 as luzes estão apagadas, a porta da rua fechada e os empregados do lado de fora da dita cuja. Tanto faz que estejam a experimentar um casaco, que o tenham na mão ou que até estejam a pegar no cartão para pagar. Horas são horas. E horas de sair são horas de sair. É a tal cena de cumprir horários, que se torna sempre muito mais interessante quando se trata de bazar do trabalho.
Tudo isto não é nada porque ainda só falámos de comprinhas do dia a dia, que nem aquecem nem arrefecem. Agora vem a parte que realmente interessa: as lojas de roupa e sapatos abrem às 10h00 e fecham às 18h30 ou, em casos de boa disposição de quem lá manda, às 19h00. Ao Domingo, estão obviamente fechadas, como ocorre também em Portugal. A grande diferença é que essa maravilhosa instituição chamada centro comercial, qual obra-prima das culturas consumistas, também fecha ao Domingo. Nos restantes dias, abre às 10h00 e fecha às 18h30, excepto à Sexta, dia em que fecha meia hora mais tarde. Estão a ver o Corte Inglés? Ou, melhor ainda, o Colombo? Ou, já no patamar do extraordinário, o Oeiras Parque? Pois… Estão vocês mas não estão os belgas nem os estrangeiros que aqui vivemos. Em primeiro lugar, porque a noção de centro comercial como espaço onde passeamos, vamos ao cinema, espreitamos as montras, fazemos as compras da casa, damos uma espreitadela às novidades literárias e fazemos chi-chi sem pagar, tudo quando nos apetece, seja às oito ou às dez da noite, faça frio ou faça sol, seja dia de semana ou fim-de-semana, pura e simplesmente não existe. Aquela sensação tão agradável de entrar num centro comercial e esquecer que chove a cântaros, troveja, está um frio de rachar ou um calor atabafante, porque tudo isso se passa lá fora e cá dentro está sempre calor no Inverno e fresco no Verão, há música se é Natal e festas se o centro faz anos, é desconhecida por aqui. Como me perguntava sabiamente a minha amiga Sofia este Verão, «então mas onde é que as pessoas se vão entreter quando saem do trabalho??».
Se julgavam que já tinham visto tudo, desenganem-se. O pior de todo este imbróglio ainda está para vir. Como se já não bastasse o centro fechar às seis e meia e tudo fechar ao Domingo, ainda por cima o dito cujo é filho único. Sim, leram bem. O centro comercial é uma expressão que aqui apenas se utiliza no singular. Não se pergunta «a que centro vamos?» porque simplesmente não há alternativas. Nesta altura do campeonato, presumo que já nem valha a pena dizer que o dito cujo não inclui cinemas como os nossos, mas inclui a única Fnac cá da terra. Esta parte dispensa comentários. Ah, estão a pensar naqueles programas «cinema + compras + jantar»? Esqueçam…
Como vos dizia na última mensagem, fui ver o novo filme do Woody Allen e, como ainda aqui estou, é porque a Scarlett Johansson não me levou para Hollywood. Ela bem tentou mas eu com a idade estou a ficar muito selectivo… A propósito, o filme não vale um caracol, não fosse serem todos muito bonitos e estar lá a Penélope Cruz, que além de bonita se transformou numa grande actriz, e eu tinha dado o dinheiro por mal empregue. Este fim-de-semana fui ver o W., um retrato impiedoso e satírico do tio Bush que fala com a boca cheia e agora vai para a reforma. Se ainda não viram, recomendo, porque vão descobrir que, afinal, o senhor até é boa pessoa, mas levou a vida inteira a ser descriminado pelo pai. Até que um dia deu-lhe para provar ao pai que era capaz de fazer alguma coisa e meteu-se na política. E lá fez imensas coisas, nenhuma delas útil ou construtiva mas isso agora não interessa nada…
O que já não recomendo é o novo James Bond, que vi de uma posição absolutamente privilegiada: da primeira fila! Ainda pró cima, numa sala de ecrã gigante. Chama-se a isto «envolver-se na trama». É como se fizéssemos parte da acção. A tal ponto estava eu envolvido que até via as borbulhas do senhor!! Que, muito justamente, foi considerado o melhor James Bond desde o Sean Connery – quanto ao filme, já não dá para grandes comparações…
Boa semana!

domingo, 2 de novembro de 2008

Três dias em Pequim

Visitar Pequim sem ver a Cidade Proibida não é visitar Pequim. Por isso mesmo, foi por aí que continuou o nosso programa de viagem, não sem antes passar pela Praça de Tiananmen, que tem no extremo norte o mausoléu do Mao e a sul o Portão da Paz Celestial, que a separa da Cidade Proibida. Foi nesta praça que o Mao proclamou a fundação da República Popular da China em 1949 e foi também lá que, quarenta anos depois, o regime massacrou centenas de opositores. Memórias nada edificantes numa praça atafulhada de turistas, que se acotovelavam para chegar à Cidade Proibida. Que – espero não vos desapontar – é muito bonita mas não propriamente espectacular como eu imaginava. A verdade é que a maioria dos pavilhões, dispostos em forma de labirinto, estão vazios, pois a maior parte do que lá estava foi levado para um museu em Taipei. O que só mostra que esta gente pensa com os pés, porque se pensasse com a cabeça punha lá umas mobílias quaisquer, como o Salazar pôs no Castelo de Guimarães a fingir que as ditas cujas lá estiveram a vida toda. Claro que toda a gente repara que nada daquilo lá esteve desde sempre mas, pelo menos, a coisa fica mais composta. Falta lá o espírito pragmático dos portugueses! Aqui ficam algumas imagens.






Depois de visitar o Palácio de Verão, fomos finalmente apresentados a um dos mais famosos embaixadores de Pequim no planeta… o pato! Ao contrário do que possam pensar, não é lá muito diferente do que comemos em Lisboa ou noutro lado qualquer mas é, sem dúvida, apetitoso. No entanto, se o prato principal variou de refeição para refeição, já a sobremesa foi sempre melancia, que vinha invariavelmente racionada: um quarto de fatia para cada um. Por alguma razão os chineses são tão magrinhos…
Outro ponto de paragem obrigatório em Pequim é a Grande Muralha, que começou a ser construída no século VI a. C. e liga a China do Mar Amarelo à Mongólia, atravessando 6 400 quilómetros. É por isso que, como diz a minha tia, é mais impressionante vista na televisão, porque, empoleirados no alto da coisa em Badaling, apenas vemos uma parte ínfima do que a muralha realmente é. Apesar da deslumbrante paisagem em redor que poderão ver nas imagens, a beleza da construção está efectivamente na sua grandiosidade, que só podemos contemplar quando a vemos de cima. Deve ter sido por isso que a minha tia resolveu parar ao fim dos primeiros lances de escadas, porque, assim como assim, por mais alto que subisse nunca veria a muralha por inteiro. Consta que, durante a dinastia Ming, a muralha chegou a ser guardada por um milhão de homens. O que, bem vistas as coisas, não é nada de especial: afinal os chineses são tantos milhões que bem se podem dar ao luxo de ter um milhão a guardar uma muralha. E quem diz um diz dois ou três!





Não nos podíamos despedir de Pequim sem visitar um dos mais importantes pontos turísticos da cidade: o Yashow. E agora perguntam vocês: mas que é isso do Yashow, que nunca ouvi tal nome? Ora aí está um segredo bem guardado que vou partilhar convosco. O Yashow é um mercado de três andares, uma espécie de mistura entre feira de Carcavelos e centro comercial da Mouraria (quem não conhece não perde nada), mas muito mais composto e organizado. Ali vende-se de tudo, desde roupa a acessórios, e por preços que não vos passam pela cabeça. Obviamente, tudo – tudo mesmo – é de marcas de luxo, porque material pindérico não tem direito a entrar. De modo que… já estão a ver o resultado, não estão? Na manhã antes de dizer adeus a Pequim, este vosso amigo foi buscar um belíssimo fato de caxemira preto, feito à medida e ao gosto de moi-même, por um preço a que não compramos nenhum fato aqui, nem que seja na boa da Zara. Pelo caminho arremataram-se mais umas coisitas para que a mala não voltasse para Lisboa apenas meia cheia, porque, como se recordarão da mensagem com esse mesmo título, uma mala meia cheia é uma dor de cabeça, já que tudo o que lá está dentro anda aos tombos de um lado para o outro. Ao passo que numa mala cheia não há espaço para nada andar aos tombos, logo o conteúdo chega ao destino sem rugas nem amolgadelas. Digam lá se eu não tenho boas ideias!!
Hoje termino por aqui, pois daqui a pouco vou ver o novo filme do Woody Allen. E, como certamente compreendem, não posso deixar a Scarlett Johansson à minha espera, pois não? Se não colocar mensagens nos próximos dias, já sabem o motivo: ela perdeu-se de amores por mim e levou-me para Hollywood!
Boa semana!