segunda-feira, 10 de novembro de 2008

O centro comercial

Hoje faço uma pequena interrupção na viagem à China, que nos deixou entre Pequim e Xangai, para vos contar como é fazer compras em Bruxelas. Tarefa árdua, mal compreendida e altamente dificultada por quem está do lado de lá de um balcão ou do lado de dentro de uma loja. E mal-amada também pela classe política aqui do burgo. Mas fundamental para que a economia se recomponha e funcione – e se há algo de que a economia mundial necessita é mesmo de se recompor! Claro está que se nenhum país está livre da crise, a Bélgica também não. Mas nem mesmo assim a coisa se torna mais fácil. Políticos desta terra, leiam o meu blogue! Comerciantes deste país, ouçam os meus conselhos! Haverá alguém que tome medidas?...
Tudo começa com os horários. Os horários são uma maçada tremenda, porque uma vez estipulados, têm de ser cumpridos. E, como toda a gente sabe, obedecer a horários implica chegar a horas, o que, evidentemente, é uma canseira ainda maior. Agora até nem estou a gozar, porque como todos sabem, a pontualidade não é propriamente o meu forte. Ora aqui no coração da Europa, os horários de abertura das lojas são tão parecidos com os nossos como a água e o azeite. O pequeno comércio, que abunda aqui no meu bairro, abre quando quer e lhe apetece. O frachising de uma famosa cadeia de lavandarias (isto aqui é como na televisão, não se pode dizer marcas a menos que paguem) abre às 7h00 e fecha às 18h00, o que é um abuso brutal mas dá um jeitão porque a malta não consegue sair muito antes das 18h00 e assim passa lá de manhã a deixar os fatos para limpar a seco. Fecha aos sábados e domingos, ao passo que a lavandaria da mesma empresa no meu bairro português abre ao Sábado. O café em frente abre às 7h30 e fecha às 15h00, porque, como hão-de entender, alguém terá de compensar o exagero de horas laborais despendidas pelos senhores da lavandaria. A outra lavandaria, que não é de nenhuma cadeia internacional mas tem uma empregada muito mais simpática, abre às 10h00 e também fecha às 18h00. Abre ao Sábado até às 12h00, coisa absolutamente inútil porque, assim como assim, estamos todos a dormir e, se por um mero acaso, estivermos acordados e, por um acaso ainda mais remoto, pensarmos em roupa, é porque vamos entrar no banho e convém escolher o que vestir primeiro. Os supermercados abrem às 8h30 e fecham às 19h30. Ambos fecham ao Domingo, excepto um mais pequeno, onde os produtos são os mesmos porque é da mesma cadeia mas os preços são mais elevados. A bem do rigor, cabe notar que quando eu digo que uma loja fecha às 19h00 significa, como se lembrarão de mensagens anteriores, que às 19h00 as luzes estão apagadas, a porta da rua fechada e os empregados do lado de fora da dita cuja. Tanto faz que estejam a experimentar um casaco, que o tenham na mão ou que até estejam a pegar no cartão para pagar. Horas são horas. E horas de sair são horas de sair. É a tal cena de cumprir horários, que se torna sempre muito mais interessante quando se trata de bazar do trabalho.
Tudo isto não é nada porque ainda só falámos de comprinhas do dia a dia, que nem aquecem nem arrefecem. Agora vem a parte que realmente interessa: as lojas de roupa e sapatos abrem às 10h00 e fecham às 18h30 ou, em casos de boa disposição de quem lá manda, às 19h00. Ao Domingo, estão obviamente fechadas, como ocorre também em Portugal. A grande diferença é que essa maravilhosa instituição chamada centro comercial, qual obra-prima das culturas consumistas, também fecha ao Domingo. Nos restantes dias, abre às 10h00 e fecha às 18h30, excepto à Sexta, dia em que fecha meia hora mais tarde. Estão a ver o Corte Inglés? Ou, melhor ainda, o Colombo? Ou, já no patamar do extraordinário, o Oeiras Parque? Pois… Estão vocês mas não estão os belgas nem os estrangeiros que aqui vivemos. Em primeiro lugar, porque a noção de centro comercial como espaço onde passeamos, vamos ao cinema, espreitamos as montras, fazemos as compras da casa, damos uma espreitadela às novidades literárias e fazemos chi-chi sem pagar, tudo quando nos apetece, seja às oito ou às dez da noite, faça frio ou faça sol, seja dia de semana ou fim-de-semana, pura e simplesmente não existe. Aquela sensação tão agradável de entrar num centro comercial e esquecer que chove a cântaros, troveja, está um frio de rachar ou um calor atabafante, porque tudo isso se passa lá fora e cá dentro está sempre calor no Inverno e fresco no Verão, há música se é Natal e festas se o centro faz anos, é desconhecida por aqui. Como me perguntava sabiamente a minha amiga Sofia este Verão, «então mas onde é que as pessoas se vão entreter quando saem do trabalho??».
Se julgavam que já tinham visto tudo, desenganem-se. O pior de todo este imbróglio ainda está para vir. Como se já não bastasse o centro fechar às seis e meia e tudo fechar ao Domingo, ainda por cima o dito cujo é filho único. Sim, leram bem. O centro comercial é uma expressão que aqui apenas se utiliza no singular. Não se pergunta «a que centro vamos?» porque simplesmente não há alternativas. Nesta altura do campeonato, presumo que já nem valha a pena dizer que o dito cujo não inclui cinemas como os nossos, mas inclui a única Fnac cá da terra. Esta parte dispensa comentários. Ah, estão a pensar naqueles programas «cinema + compras + jantar»? Esqueçam…
Como vos dizia na última mensagem, fui ver o novo filme do Woody Allen e, como ainda aqui estou, é porque a Scarlett Johansson não me levou para Hollywood. Ela bem tentou mas eu com a idade estou a ficar muito selectivo… A propósito, o filme não vale um caracol, não fosse serem todos muito bonitos e estar lá a Penélope Cruz, que além de bonita se transformou numa grande actriz, e eu tinha dado o dinheiro por mal empregue. Este fim-de-semana fui ver o W., um retrato impiedoso e satírico do tio Bush que fala com a boca cheia e agora vai para a reforma. Se ainda não viram, recomendo, porque vão descobrir que, afinal, o senhor até é boa pessoa, mas levou a vida inteira a ser descriminado pelo pai. Até que um dia deu-lhe para provar ao pai que era capaz de fazer alguma coisa e meteu-se na política. E lá fez imensas coisas, nenhuma delas útil ou construtiva mas isso agora não interessa nada…
O que já não recomendo é o novo James Bond, que vi de uma posição absolutamente privilegiada: da primeira fila! Ainda pró cima, numa sala de ecrã gigante. Chama-se a isto «envolver-se na trama». É como se fizéssemos parte da acção. A tal ponto estava eu envolvido que até via as borbulhas do senhor!! Que, muito justamente, foi considerado o melhor James Bond desde o Sean Connery – quanto ao filme, já não dá para grandes comparações…
Boa semana!

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