Hora de almoço. Salteado de marisco. Está óptimo, um dia destes ensino a fazer.
Apetece-me uma batatinha frita. Só uma não vai estragar a dieta. Bom, duas ou três também não... Deito as batatas fritas no prato e levo para a varanda. Mas sou interrompido pelo telemóvel. Entretanto, ouço qualquer coisa a voar. São as batatas, que já estão espalhadas pelo chão da varanda. Desligo. Apanho as batatas. Recomeço a refeição. Ainda não acabei, mas estava-me mesmo a apetecer uma empada. E até calha bem que tenho ali umas congeladas. Porreiro. Vou buscar a empada. Descubro que a arca tem meio metro de gelo na primeira prateleira. Agarro numa espátula – de entre as coisas que me ocorreram para tirar o gelo, foi a que estava mais à mão. Não, não procurei muito, escusam de perguntar. Começo a bater no gelo. Que começa a cair. Para dentro da gaveta. Tiro a gaveta. Ponho um prato de sopa para apanhar o gelo – não, também não tinha mais nada à mão e se tinha não procurei. Despejo o gelo, volto a colocar a gaveta, fecho a arca. Retomo a minha refeição e pelo caminho esqueci-me de que me apetecia a empada que está na origem desta cena. Levo de novo o tabuleiro para a varanda. A faca cheia de molho ganha vida e salta para o chão. Mas eu mantenho a calma, nada de irritações, “laisse tomber”. Termino a refeição e vou pegar no jornal que ficou na varanda. Então é que estão os horários dos cinemas? Página 32? Mas não há cá nenhuma página 32. O caderno principal só tem quatro páginas! Não pode ser, eu comecei a lê-lo no ginásio e tinha muitas páginas. Então a reportagem sobre a América dos confins na página 16? Não está cá. Faltam-me dois terços do jornal. Ora esperem lá… Eu comprei um jornal inteiro, cheguei a casa com um jornal inteiro e agora tenho um terço do jornal. Não estou maluco – acho eu… E não bebi nada, ok? Querem lá ver que o barulho de coisas a voar era o jornal? Inspecciono as varandas alheias em busca das secções perdidas. Nem rasto. Acreditam que perdi um jornal dentro da minha própria casa?