sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Quem vai acordar o falador?




Hoje o mundo dedicou-se a um jogo muito original chamado “Quem vai acordar o falador?”.
Detesto acordar cedo. Como dizia uma professora minha da faculdade, até determinada hora da manhã, ainda não é de manhã cedo, é de noite tarde. Mas há quem discorde e há mesmo quem funcione a todo o gás a horas em que nem o sol ainda acordou. E se o sol que é fonte de vida ainda não se ergueu, porque havemos nós de andar levantados?
Toda esta problemática foi devidamente aproveitada por Bruxelas para lançar o jogo “Quem vai acordar o falador?”, cuja primeira (e esperemos que última) edição decorreu esta manhã na minha casa. O papel deste vosso amigo falador era o do peão, aquela peça que é manipulada durante o jogo e cuja tranquilidade vai sendo perturbada à medida que o jogo avança. Assim sendo, não me restou outra alternativa senão levantar-me à hora a que o despertador tocou, e não de meia hora depois como é hábito. Como acordo esfomeado, a minha primeira paragem é sempre a cozinha. Aliás, primeiro acendo o aquecimento, depois ligo o rádio e depois vou para a cozinha. Mas hoje não. Hoje fui diretamente para o duche, o que vale é que, por causa dos sete graus negativos da noite de ontem, deixei o aquecimento ligado e a casa de banho estava habitável. Vinte minutos depois, eu já estava lavado, vestido e a tirar a roupa do estendal, quando entra em cena a primeira jogadora: a empregada. Que vem sempre à hora de almoço, mas agora mudou temporariamente para a manhã.
- Olá bom dia.
Só se for para si, que para mim ainda nem sequer é dia, é noite tarde.
Eis que entretanto o circo fica completo com a chegada do segundo jogador: o homem que vem limpar a caldeira. E não é um, são dois. Desmontam, inspecionam, saem para ir buscar peças ao carro, entram, mexem, cortam a água, saem outra vez para ir buscar mais peças, entra vento, a casa arrefece, eu arrefeço, a empregada não pode limpar porque não pode usar água, nem pode passar para o quarto. A minha casa está transformada num estaleiro, mas eu, que apesar de mal acordado estou otimista, vou aproveitar o tempo para arranjar o jantar. A E. veio cá jantar hoje. Vou arranjar a salada… não, afinal não arranjo a salada, porque a toalha está no lava-louças mergulhada numa barrela de sabão. Entretanto acaba o detergente do chão e não há mais. Ora bem, vou aproveitar para ir ao supermercado comprar. Mas não, afinal não posso ir, os homens já estão quase a terminar a limpeza da caldeira e tenho de lhes pagar. Nesta altura, ambos os jogadores estão a ganhar, acordaram o falador e já lhe deram conta da paciência. Mas falta o terceiro jogador: a meteorologia. A meteorologia é que vai dar conta de mim. Estão quatro graus negativos. Até domingo, a máxima é de – precisamente – quatro graus negativos. Máxima, leram bem. Lá saio de casa enrolado num cachecol, como uma mulher árabe em versão europeia e com os óculos embaciados.
 Esta noite, dizem, será a mais fria dos últimos tempos. Se amanhã der notícias, é porque não saí à rua. Se não der notícias, é porque saí. Nesse caso, alguém faça o favor de me vir tirar do congelador e me enfiar no micro-ondas para descongelar. Obrigado.

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